
ENTREVISTA RECORD/ANTENA 1
Humberto Coelho será o responsável pelas Selecções caso Fernando Gomes vença a corrida à liderança da FPF. Aos 61 anos, mantém em aberto a carreira de treinador e diz que esta é “apenas mais uma etapa”. Sobre a qual já deixou algumas pistas.
RECORD – O que sentiu quando percebeu que Portugal estava qualificado para a fase final do Euro’2012? Aliviado?
HUMBERTO COELHO – Sim, foi importante. Não só pela parte desportiva, mas também pela questão financeira. Estas qualificações também são fundamentais para o prestígio dos jogadores e dos técnicos. Tudo isso é importante e não podia ficar em causa. Já nos habituámos a este patamar, com presenças regulares nas fases finais, e por isso não podíamos falhar.
R – Chegou a temer que não conseguíssemos lá chegar?
HC – Acredito sempre muito nos nossos jogadores. Estão muito habituados à alta competição, a estes momentos. Penso é que num futuro próximo, Portugal terá de passar para um patamar superior. Deveremos estar no grupo das equipas que conseguem qualificar-se directamente. Porque há um prestígio atrás de nós que nos obriga a pensar desta forma.
R – Já são duas qualificações consecutivas através do playoff…
HC – Pois. Temos de encontrar pontos de motivação e confiança para que os nossos jogadores possam voltar a alcançar a qualificação de forma directa.
R – É só um problema de confiança ou já começa a ser também falta de matéria-prima?
HC – Continuamos a ter uma boa geração de jogadores. Os efeitos da globalização afectam-nos e é possível que daqui por uns anos venhamos a ter problemas ainda maiores. Por isso é que se torna cada vez mais urgente iniciar um trabalho de base para combater o que não está bem. É preciso dizer, ainda assim, que continuamos a ter uma grande geração de jogadores.
R – Como é que se pode dar a inversão? O que é urgente fazer para que os clubes portugueses tenham jogadores portugueses?
HC – Um trabalho sério ao nível da formação, tal como está no nosso programa de candidatura. É inevitável que venha a existir uma quota para os jogadores portugueses logo na formação. Por exemplo, uma equipa não poderá ser composta, em momento algum do jogo, por menos de 70% de jogadores portugueses. Isso é uma das medidas que queremos implementar e que pretendemos discutir com os nossos parceiros. Só assim podemos permitir a evolução do jogador português.
R – Mas isso tem de ser feito muito rapidamente, porque ainda há pouco tempo um Benfica-Sporting em juniores tinha pelo menos 12 ou 13 estrangeiros em campo…
HC – Essa será uma das prioridades do nosso projecto. Pretendemos arrancar com os escalões mais jovens, para depois podermos evoluir até ao topo da pirâmide.
R – Voltando à qualificação para o Euro’2012. Acha que a situação que se viveu em torno do anterior seleccionador nacional, Carlos Queiroz, foi um dos principais motivos para que o apuramento tivesse chegado tão tarde?
HC – Entrámos logo mal devido a uma conjuntura que não era, de facto, nada favorável. O pós-Mundial não foi bem gerido e isso acabou por ter influência negativa na equipa. O Paulo Bento conseguiu recuperar bem. Tem muito mérito. Trabalhou bastante bem ao nível da motivação.
R – Demos dois jogos de avanço, não foi?
HC – Exacto, demos dois jogos de avanço. Com outro arranque teríamos conseguido qualificar-nos directamente, não tenho dúvidas.
R – Com Bosingwa e Ricardo Carvalho também poderia ter sido mais fácil…
HC – Isso não sei. Não conheço os contornos dos casos. É sempre aborrecido ver jogadores ficarem de fora. É preciso trabalhar para que coisas destas não aconteçam. Mas isso é o mais difícil, porque já fui seleccionador nacional e sei do que falo. Gerir uma selecção é uma coisa delicada.
R – Mas como observador atento, embora de fora, parece-lhe que estes dois casos foram bem geridos?
HC – Não sei. Estou de fora. Ainda há dias o Figo dizia que, de vez em quando, há um “vaipe” que dá nos jogadores. Mas não sei como estes casos se passaram em concreto e, portanto, não vou emitir opinião. A única coisa que posso é lamentar que tenham acontecido.
R – Mas a partir do dia 10 de Dezembro, em caso de vitória nas eleições, o Humberto poderá ter a possibilidade de influenciar estes processos. Pretende fazê-lo?
HC – Importante é que o seleccionador possa contar com alguém capaz de se aperceber dessas situações antes de elas acontecerem. Pela experiência que tive como jogador e como seleccionador, acho que isto é o mais importante.
R – Mas pensa vir a actuar nos casos concretos de Bosingwa e Ricardo Carvalho? Ou serão, como diz o seleccionador nacional, temas completamente encerrados?
HC – A primeira coisa que vamos fazer se viermos a ser eleitos é olhar para os processos. Não me comprometo nem posso fazê-lo. Não estou no cargo, as eleições ainda nem aconteceram…
R – Paulo Bento já afirmou que pretendia partir para o Euro’2012 com o seu futuro imediato definido. É possível, antes dessa altura, que o seleccionador fique a saber se a FPF conta com ele para o Mundial 2014? Ou não?
HC – Não conheço os pormenores do contrato que existe e nem sequer ainda sei se vou ser eleito. A única coisa que posso dizer é que Paulo Bento fez um trabalho muito bom até agora. Recuperou a equipa, está na fase final e em caso de vitória vamos apoiá-lo incondicionalmente.
R – Mas admite a possibilidade de ser Paulo Bento a comandar a Selecção Nacional até ao Mundial 2014?
HC – Admito essa possibilidade. Mas, como digo, primeiro é preciso avaliar o contrato.
R – O que é que Portugal está obrigado a fazer neste Euro’2012? Qual será o patamar mínimo?
HC – Não há patamares mínimos. Quando se está numa fase final é preciso perceber que já não há equipas fracas. Dependerá também do sorteio, não é? Tem acontecido que apanhamos selecções mais fáceis nas fases de qualificação e depois encontramos os mais poderosos logo nos primeiros jogos das fases finais…
R – Em 2000, o senhor também não teve um sorteio propriamente muito feliz (Inglaterra, Roménia e Alemanha)…
HC – Pois não, é verdade. O que interessa, em qualquer caso, é tentarmos fazer mais qualquer coisa. Temos os melhores jogadores do Mundo. Precisamos de incutir motivação em toda a gente para que Portugal volte a ter uma grande participação. Provavelmente, fazendo ainda melhor do que aquilo que já se conseguiu. Vamos esperar pelo sorteio, porque eu também acho que há muita coisa que depende do primeiro jogo. O primeiro jogo é muito importante…
R – Chegar aos quartos-de-final seria o mínimo exigível?
HC – Não sei, é complicado estarmos a fazer previsões. Já vimos Portugal ser eliminado na primeira fase. A França já foi eliminada na primeira fase. Tudo pode acontecer.
R – O Humberto acabou de dizer que Portugal tem alguns dos melhores jogadores do Mundo. Não é legítimo, até por isso, que se exija pelo menos o resultado de 2008 (quartos-de-final)?
HC – Até podemos pensar em mais do que isso. Se já ficámos tão perto de vencer o Euro, por que não voltarmos a pensar em grande? O importante é começarmos bem. Se entramos a ganhar no primeiro jogo…
R – Em 2004 entrámos a perder e acabámos por chegar à final…
HC – Pois, mas estávamos em casa (risos).
R – De que forma é que olha para os casos de Deco, Pepe ou Liedson? É a favor ou contra a naturalização de jogadores?
HC – Isso aconteceu porque, a partir de um determinado momento, os nossos jogadores jovens deixaram de ter condições para evoluir. O nosso programa contempla várias medidas para que isso seja rapidamente alterado.
R – Não respondeu à pergunta.
HC – Vamos lá a ver: se o Messi quiser naturalizar-se português, nada contra. O que não se pode é naturalizar um jogador só para que ele faça um jogo por Portugal. Não se pode naturalizar um jogador que tenha 30 anos.
R – Está a falar de Liedson?
HC – Não de Liedson em particular, estou a falar na generalidade. Tenho o maior respeito pelo Liedson, acho que é um jogador fantástico, um grande goleador.
R – Carlos Godinho é reconhecidamente um profissional competente, que teve um papel importante na vida recente das Seleções Nacionais. A sua lista conta com ele?
HC – Será o Fernando Gomes a ter a primeira palavra no momento em que chegarmos. O que digo é que trabalhei com o Carlos Godinho e considero-o um profissional competentíssimo. Tivemos uma relação extraordinária. É um elemento fundamental para qualquer seleccionador nacional. Tem conhecimento sobre áreas sensíveis e é muito importante na articulação entre os jogadores e a equipa técnica, o que é decisivo nos dias de hoje.
R – Ou seja, no que depender de si, é para continuar?
HC – Vejo-o como alguém muito competente, mas não quero antecipar-me a ninguém.
R – Mas é natural que Fernando Gomes lhe peça uma opinião.
HC – Darei uma opinião positiva, sem dúvida.
R – As eleições na FPF realizam-se no dia 10 de Dezembro. Sabe que jogo grande acontece nesse dia?
HC – Não estou a ver… Só estou preocupado com as eleições (risos).
R – Real Madrid-Barcelona.
HC – Ah, pois é. Grande jogo, mesmo. Assisti em Madrid ao Real-Barça, da Supertaça de Espanha. Passei uma semana em Madrid e fui convidado pelo Mourinho para ver esse jogo. Fiquei encantado. É espectacular, são jogos fantásticos. Neste momento, penso que o Real Madrid está melhor do que o Barcelona. Acho que vai ter grandes resultados nesta temporada e não só no campeonato espanhol.
R – Toni é seu adversário directo nestas eleições. Já falaram sobre a luta em que se meteram?
HC – Claro que sim. Temos falado. Cada um vai defender as suas ideias e nada disto irá afectar a nossa amizade, como é óbvio. O Toni é uma pessoa com um grande passado no futebol, muito capaz, que também estaria à altura das exigências. Mas eu acredito que seja a lista de Fernando Gomes a vencer, claro.
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